RESUMO
A análise de acidentes permite compreender melhor as teorias da segurança, que explicam estes fenómenos e ajuda na compreensão da relação que se estabelece entre variáveis contribuindo para a prevenção no que respeita à ocorrência de acidentes.
Neste estudo, serão isoladas as teorias da casualidade na análise de acidentes para perceber o seu impacto e a sua dinâmica em o contexto real. É um estudo de cariz quantitativo, que contou com a participação de 20 técnicos de segurança no trabalho. Os resultados obtidos na análise de clusters, permitem agrupar os técnicos de segurança e saúde no trabalho em 3 clusters.
Dos resultados podemos inferir que existem algumas questões que são consideradas relevantes, pelos técnicos, na análise de acidentes, que estão mais relacionadas com as teorias relevantes no contexto teórico, mas nota-se a ausência de uma perspetiva integradora e teórica que seja comum a todos os especialistas
Palavras-chave: Modelos de segurança; Análise de acidentes; Análise de Clusters.
INTRODUÇÃO
Desde a Revolução Industrial, em virtude da necessidade de colmatar o crescente número de acidentes e mortes que se registavam anualmente (Dekker, 2005; McSween, 2003), a indústria teve que evoluir de forma bastante significativa, procurando mitigar os riscos inerentes a essa recente condição desafiadora.
Neste sentido, a gestão da segurança foi a resposta encontrada pelas várias indústrias, a nível mundial, procurando inverter a degradação da vida humana instalada, com custos para os trabalhadores, seus familiares e para a sociedade de forma geral (Gutierrez, 2013; McSween, 2003).
Emerge assim, neste contexto, um crescente interesse da indústria mundial, determinada em muito pela pressão social, pelas questões que se prendem com a análise dos acidentes, e com os conceitos como cultura de segurança, segurança comportamental, combinando-os com modelos e metodologias que procuravam tornar-se instrumentos para a prevenção e a redução do potencial de risco (Dekker, 2005; McSween, 2003) e que aumentam a resiliencia dos sistemas (Palma-Oliveira et al., 2016).
Poderemos considerar que, tanto do ponto de vista técnico como de senso comum, a existência de acidentes e quase-acidentes de trabalho ou mesmo de acidentes industriais de largo espectro, constitui a pedra de toque na investigação e análise dos modelos de segurança das organizações. As diferentes teorias de segurança consideram, assim, os acidentes como o reflexo, em maior ou menor grau, das falhas latentes ou das condições do sistema e da sua resiliência e como tal são oportunidades únicas de análise desses modelos.
E não é a gravidade dos acidentes, isto é, a perda ou não de vidas humanas ou a extensão dos estragos físicos de um acidente industrial, que permite julgar da extensão das faltas do sistema. Um pequeno acidente laboral pode ser tão ou mais revelador da situação do sistema organizacional como um grande acidente industrial.
Neste contexto torna-se fundamental o processo de investigação e análise de acidentes nas suas múltiplas dimensões da interação organização / ambiente. No entanto é nossa perceção que a análise de acidentes é muito centrada nas causas imediatas e não tem a profundidade necessária para, usando as teorias explicativas disponíveis, deduzir as necessárias lições para o sistema organizacional.
Estes devem ser analisados tendo em consideração os diferentes níveis de causalidade, sendo que as análises devem ser realizadas de forma simples e sistemática com o intuito de serem facilmente reproduzidas.
O que nos permite concluir, é que existe uma falha metodológica na análise dos acidentes de trabalho, porque alguns destes tem um nível de complexidade muito elevado e que se prendem com falhas a vários níveis (sistemas de segurança, com as opções da gestão, com violações dos sistemas de segurança, com o não cumprimento de regras, etc.) e não devem estar dependentes da sensibilidade do técnico e com a simplificação das respetivas análises.
Na sequência da investigação em curso, serão isoladas as teorias da casualidade na análise de acidentes para perceber o seu impacto e a sua dinâmica com o contexto real. Desta forma, devido à complexidade dos modelos e métodos de análise o que se pretende com a presente investigação, é avaliar se os técnicos de segurança dispõem ou não de um processo sistémico de reprodução de análises de acidentes que utilize um modelo ou mais modelos de análise?
A EVOLUÇÃO DOS MODELOS DE SEGURANÇA
De acordo com a teoria sistémica a sociedade moderna é composta por um vasto conjunto de sistemas, tendo estes a especificidade de serem abertos e de interagirem entre si, o que faz aumentar o nível de complexidade, devido à rede intrincada de relações entre os vários sistemas sociotécnicos (Hollnagel, 2004). Para os autores Palma-Oliveira et al., (2016), as organizações são sistemas complexos compostos por vários subsistemas que se vão transformando e alterando devido às várias interações que estabelecem entre si e com o meio.
Nesse sentido, é imprescindível perceber a natureza desses sistemas sociotécnicos, nomeadamente a sua cultura, o setor de atividade em que operam, o processo produtivo e as tecnologias envolvidas, o seu quadro de efetivos, que produtos ou serviços comercializam, bem como os mercados onde operam, relacionando-os com a cultura de origem e/ou do país onde atuam (Palma-Oliveira et al., 2016). Mas, acima de tudo, é imprescindível conhecer a história desse mesmo sistema (Palma-Oliveira et al., 2016).
"(...) no âmbito do processo de investigação da sinistralidade laboral existem um conjunto de teorias e de modelos explicativos de referência que podem ser adotados pelos investigadores que terão um papel vital na natureza das conclusões obtidas."
A ocorrência de acidentes, sendo normal nos sistemas sociotécnicos (Hollnagel, 2004), deve ser considerada como uma fonte privilegiada de informação (Palma-Oliveira et. al., 2016). Isto porque a análise cuidada e sistemática destes acidentes pode produzir inputs que são a chave para a promoção da mudança organizacional, premiando a aprendizagem e consequentemente permitindo a melhoria dos sistemas (Dekker, 2006; Woods, 2006).
Posto isto, e no que respeita à análise dos acidentes laborais, podemos encontrar uma grande diversidade de modelos. Atendendo, então à multiplicidade de modelos, às suas especificidades e ainda à complexidade da informação gerada por cada um deles, Hollnagel (2004) propõe a sua sistematização em três grandes grupos:
1) Os modelos de acidentes sequenciais - Teoria do Dominó (Heinrich,1931);
2) Os modelos de acidentes epidemiológicos - Modelo do Queijo Suíço (Reason,1990);
3) Os modelos de acidentes sistémicos - Modelo de Ressonância Funcional (Hollnagel, 2004).
Os modelos de acidentes sequenciais, são considerados os mais simples, e descrevem o acidente como resultado de uma cadeia de acontecimentos ocorridos numa ordem específica, acabando no acidente em si (Hollnagel, 2004). A teoria que tradicionalmente se encaixa neste modelo dos acidentes sequenciais é a Teoria do Dominó, proposta por Heinrich (1931), recorrendo a uma analogia analítica para explicar a ocorrência de acidentes: as peças do dominó estão alinhadas e representam a existência de cinco fatores na sequência do acidente: ambiente social, as falhas individuais, os atos ou condições inseguras, os acidentes e os feridos (Heinrich, 1931). Estes cinco elementos estão assim organizados numa dinâmica de dominó, em que a queda da primeira peça desencadeia a queda da sequência inteira (Heinrich, 1931) que termina no acidente.
Por sua vez, os modelos de acidentes epidemiológicos descrevem o acidente como o resultado de uma combinação de fatores, uns visíveis e outros não, mas que ocorrem em simultâneo, (Hollnagel,2004). Por seu lado, James Reason (1990) desenvolveu um modelo organizacional, o Modelo do Queijo Suíço, para explicar a causa dos acidentes em sistemas tecnológicos complexos. Este autor assume que os acidentes organizacionais não ocorrem devido a um único erro humano, mas sim pela interconexão de vários fatores que ocorrem a vários níveis da organização. Nesta abordagem, a causa imediata ou próxima do acidente é a falha das pessoas que estão diretamente envolvidas na regulação do processo ou em interação com a tecnologia (Reason, 1990). Reason (1990) considera ainda que os “buracos” nas defesas surgem por duas razões: as falhas ativas e as condições latentes, sendo que quase todos os eventos adversos envolvem a combinação destes dois tipos de fatores. O modelo acidentes epidemiológicos implica assim que a integridade das defesas de um sistema de segurança, possa ser apurada com mais detalhe se estas forem mais tangíveis e mensuráveis (Hollnagel, 2004).
Por último, os modelos de acidentes sistémicos, por norma, são simultaneamente considerados simples e concomitantemente mais complexos. Nesta abordagem os acidentes são um fenómeno emergente, ou seja, como algo normal de ocorrer e até certo ponto expectável (Hollnagel, 2004; Perrow, 1999). No modelo de acidentes sistémico, proposto por Hollnagel (2004) é utilizada uma analogia, e adota os termos “estocástico” e “ressonância” para explicar a forma como os acidentes ocorrem. Assim, se por um lado, o modelo estocástico explica a variabilidade do sistema, dedicando-se à análise da probabilidade das variações se manifestarem de forma aleatória e imprecisa, por outro lado, o fenómeno da ressonância encontra-se associado às variações que agem em simultâneo e na mesma frequência, ampliando o risco de acidentes. Tal, só acontece na medida em que os fatores causais que perturbam os sistemas são múltiplos, e não lineares, atuando simultaneamente e de forma desordenada - são os designados movimentos brownianos (Hollnagel, 2004).
O modelo sistémico propõem assim que a tónica seja dada às ações preventivas, devendo a variablidade ser monitorizada e desenvolvida a capacidade de adaptação dos sistemas às pressões organizacionais uma caracteristica da resiliência (Palma-Oliveira et al., 2016). Contudo, Hollnagel (2004) complementou esta abordagem com o desenvolvimento do Modelo de Ressonância Funcional avaliando a função real a fim de perceber a teia de relações existentes na execução das tarefas normais de trabalho, como forma basilar para explicar os acidentes.
Em suma, no âmbito do processo de investigação da sinistralidade laboral existem um conjunto de teorias e de modelos explicativos de referência que podem ser adotados pelos investigadores que terão um papel vital na natureza das conclusões obtidas.
"(...) no que respeita à análise dos acidentes laborais, podemos encontrar uma grande diversidade de modelos. (...) Hollnagel (2004) propõe a sua sistematização em três grandes grupos:
1) Os modelos de acidentes sequenciais - Teoria do Dominó (Heinrich,1931);
2) Os modelos de acidentes epidemiológicos - Modelo do Queijo Suíço (Reason,1990);
3) Os modelos de acidentes sistémicos - Modelo de Ressonância Funcional."
A ANÁLISE DE ACIDENTES E A SUA RELAÇÃO COM OS MODELOS E MÉTODOS DE SEGURANÇA
Como foi anteriormente referido, os acidentes embora sejam ocorrências com efeitos negativos na vida das organizações e dos seus colaboradores (Hollnagel, 2004), estes podem ser vistos como uma fonte de informação privilegiada fornecida pelo sistema, com o intuito de corrigir, melhorar e aperfeiçoar os sistemas de segurança aumentando a resiliência organizacional (Palma-Oliveira et al., 2016).
Os vários modelos de investigação e análise dos acidentes e as teorias explicativas da segurança que servem de base para explicar a anatomia do acidente e a sua performance, necessitam de métodos que operacionalizem estas análises. Com base no levantamento bibliográfico realizado por Lehto et al. (1991), os autores identificam 54 modelos causais e 16 métodos de investigação, num outro estudo realizado posteriormente por Gano (2001), este verificou que existem pelo menos 14 modelos causais diferentes e 17 métodos de investigação de acidentes.
Neste sentido, os vários modelos de análise conduzem as análises de acidentes num determinado sentido, pois são distintos e atribuem pesos diferenciados a fatores distintos como teremos a oportunidade de ilustrar e implicam visões ou leituras diferentes da mesma realidade.
Os modelos de acidentes sequenciais que utilizam a Teoria do Dominó (Heinrich, 1931), operacionalizam as suas análises recorrendo a uma analogia das peças do dominó que estão alinhadas e representam a existência de cinco fatores na sequência do acidente: ambiente social (as condições que nos levam a aceitar o risco), as falhas individuais, os atos ou condições inseguras (fraco planeamento, equipamento inseguro, ambiente perigoso, etc.), os acidentes e os feridos (Heinrich, 1931). Quando transpomos, para o contexto em estudo, um evento indesejado ou inesperado inicia a sequência de eventos subsequentes que levam ao acidente, tal como o proposto na teoria em causa, a queda de uma peça de dominó quebra o equilíbrio das restantes peças.
Esta teoria implica que o acidente seja provocado por uma única causa, sendo que se for possível eliminar ou retirar essa causa, o acidente não ocorrerá nem se repetirá (Heinrich, 1931). Contudo, na realidade organizacional os acidentes têm sempre mais que uma causa associada a contribuir para a sua ocorrência (Hollnagel, 2004).
Os modelos de acidentes epidemiológicos descrevem o acidente como o resultado de uma combinação de fatores, uns visíveis e outros não, mas que ocorrem em simultâneo (Hollnagel, 2004), em contexto organizacional, podemos considerar os desvios de desempenho, as condições de trabalho, as barreiras e as condições latentes deverão ser consideradas nas análises de acidentes. Nestes sistemas tecnológicos complexos, James Reason (1990) considera que os acidentes não ocorrem devido somente ao erro humano, mas sim, pela interconexão de vários fatores que ocorrem a vários níveis da organização. Para Reason (1990), a segurança organizacional e as defesas concebidas (barreiras de proteção materiais, humanas e procedimentos) podem falhar em contexto real.
Para o autor, os acidentes organizacionais podem ser definidos como situações em que as falhas latentes emergem de aspetos como as práticas dos gestores no processo de tomada de decisão, as influências culturais combinadas adversamente com eventos locais provocados (clima, localização, etc.) e as falhas ativas (erros, enganos e/ou violação, etc.) efetuadas por indivíduos ou equipas nos limites de uma organização. Reason (1990) considera ainda que os “buracos” nas defesas, surgem por duas razões: as falhas ativas são atos inseguros cometidos pelas pessoas que se encontram em contacto direto com o sistema e podem representar descuidos, esquecimentos, erros, deslizamento e violação de procedimentos, tendo um impacto curto e direto na integridade das defesas (Reason, 1990); e, as condições latentes já exemplificadas.
Por último, o modelo de acidentes sistémico identifica a necessidade de conhecer muito bem o desempenho normal do sistema, ou seja, os fatores que o impelem para o sucesso e consequentemente as falhas associadas, com os quais se poderá aprender (Hollnagel,2004). Com o intuito de aprofundar o conhecimento relativo ao domínio dos acidentes, Dekker (2006) e Hollnagel (2004) defendem a importância de distinguir o trabalho normal e o trabalho prescrito, procurando entender as variações do trabalho.
Nesta análise específica, Hollnagel (2004) propõe a análise funcional estruturada, através da análise da função real desenvolvida no sistema, assim como os recursos mobilizados na altura em que ocorre o acidente. Nesta medida, acredita-se que esta representação sistémica facilita a compreensão de todas as conexões relativas à função em análise, de todas as funções que estão relacionadas entre si e a forma como dependem umas das outras. Hollnagel (2004) enfatiza assim a identificação criteriosa das relações de causa-efeito estabelecidas entre eventos, a fim de determinar a sequência correta de eventos que deu origem ao acidente (Hollnagel, 2004; Perrow, 1999).
A cada um dos três modelos está associado um conjunto de métodos de análise dos acidentes, nomeadamante, o Método de Àrvore de Causas – Teoria dos Sistemas, o FMEA – Failure Mode and Effect Analysis – Ferramenta de Qualidade (Instituto de Qualidade Automotiva, 1995) e Fault Tree Analysis (Helman, 1995) estão fortemente associadas ao modelo sequencial. O modelo epidemológico não tem um método especifico de análise em contraposição com o modelo sequêncial, mas Hollnagel (2004) propõem que estes possam ser analisados fazendo recurso ao Método do Queijo-Suíço e à defenição dos fatores em Falhas Ativas e Falhas Latentes (classificação dos tipos barreiras, e o seu estado no momento do acidente). O modelo sistémico utiliza a Análise Funcional Estruturada ampliada por Hollnagel (2004), composta por 6 conexões que representa a função em análise e as conexões com as restantes funções em contexto organizacional.
"A cada um dos três modelos está associado um conjunto de métodos de análise dos acidentes, nomeadamante, o Método de Àrvore de Causas – Teoria dos Sistemas, o FMEA – Failure Mode and Effect Analysis – Ferramenta de Qualidade (Instituto de Qualidade Automotiva, 1995) e Fault Tree Analysis (Helman, 1995) (...)"
Neste sentido, foi possível perceber que cada um dos modelos de análise atribui um peso diferente a fatores de análise diferentes, e como tal, a forma como a análise do acidente é orientada e as principais conclusões a que se chega dependem sempre das características do modelo e do método de análise selecionado para fazer a aproximação ao contexto real.
Na sequência da investigação em curso, serão isoladas as teorias da casualidade na análise de acidentes para perceber o seu impacto e a sua dinâmica com o contexto real. Desta forma, devido à complexidade dos modelos e métodos de análise o que se pretende com a presente investigação, é avaliar se os técnicos de segurança dispõem ou não de um processo sistémico de reprodução de análises de acidentes que utilize um modelo ou mais modelos de análise?
É ou não possível identificar um modelo consistente de aplicação, a partir da comparação do modelo real com os modelos teóricos? Esse modelo a existir, será um modelo mais próximo de qual dos modelos teóricos existentes?
É possível que sendo o modelo sequencial, o modelo teórico mais simples de operacionalizar em contexto real devido à variedade de métodos e técnicas de análise disponíveis. É naturalmente o mais utilizado na análise da sinistralidade?
MÉTODO
Participantes
Colaboraram no estudo 20 técnicos de segurança que estão divididos em dois grupos: técnicos superiores de segurança no trabalho (75%) e técnicos de segurança trabalho (20%) sendo que a maioria era do género feminino (65%). Todos eles com uma antiguidade média de 10.6 anos na função (veja-se tabela 1).
Procedimentos
É uma amostra por conveniência, porque foi solicitada apenas a participação de técnicos de segurança no trabalho neste estudo. Os questionários foram ministrados a todos os participantes, em suporte papel.
Esta análise é uma parte de um estudo mais extenso, em que se estão a estudar várias variáveis. Neste estudo, foi controlado o efeito de género dos participantes, o nível de severidade e a ordem de apresentação.
Para aceder à perceção dos participantes, recorreu-se à utilização de um questionário constituído por 36 questões, em que todas respondem numa escala tipo Likert de sete pontos de concordância (em que 1- discordo totalmente e 7- concordo totalmente).
As várias questões do questionário ministrado foram formuladas com recurso a diferentes modelos de análise de acidentes, nomeadamente, o modelo sequencial, o modelo epidemiológico e o modelo sistémico. Algumas das perguntas tipo do questionário: “Apenas as causas próximas que estão na origem do acidente” (Modelo Sequencial), “Perceber se as barreiras existentes, não foram suficientes” (Modelo Epidemiológico) e “Identificar as variações do sistema, na altura em que ocorreu o acidente” (Modelo Sistémico).
Neste sentido, na primeira parte do questionário o que pretendemos perceber é a forma como os técnicos avaliam os acidentes, já na segunda parte, o que pretendemos perceber é se estes sabem qual é a metodologia que utilizam nas análises de acidentes. As perguntas tipo “Na sua prática diária, utiliza algum modelo de análise de acidentes?”, “Se sim, segue os princípios do: Sequencial? Epidemiológico? Sistémico?”, “em caso afirmativo, qual das técnicas é que utiliza?” ou “Em caso negativo, diga como o faz?”.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
No início da análise de dados criaram-se índices sintéticos consubstanciados pela categorização das questões formuladas no questionário aos técnicos de segurança no trabalho. De seguida, e com o objetivo de compreender qual ou quais as metodologias que são utilizadas pelos técnicos, prosseguindo com o seu agrupamento em função das suas escolhas. Assim, para o agrupamento/classificação dos técnicos foi efetuado com uma análise de Clusters Hierárquica e não Hierárquica (K-Means). Na análise de Clusters Hierárquica usou-se como medida de distâncias a distância euclidiana ao quadrado e Ward´s Method, como método exploratório. A análise do dendograma aconselhou a classificação dos técnicos em três clusters. A classificação dos sujeitos foi depois refinada com o procedimento não Hierárquico K-Means. O teste Anova indica-nos que os 3 Clusters estão significativamente diferenciados no grau de importância que atribuem aos 3 modelos (p ≤ .001).
A análise de clusters (veja-se tabela 2, na página seguinte) realizada permite perceber de forma clara, como é que os técnicos de segurança no trabalho se relacionam de forma implícita e explicita com os diferentes modelos de análise de acidentes.
Neste sentido, os técnicos de segurança no trabalho que estão representados no cluster 3 consideram que todos os modelos de análise de forma global são importantes, o que levante uma questão, como é que é possível deduzir um processo sistemático de análise se é tudo igualmente importante.
O cluster 2 tem uma estrutura semelhante á cluster 3, embora no cluster 2 os técnicos de segurança no trabalho partem do princípio inverso ao do cluster 3, ou seja, não consideram nenhum dos modelos de análise de acidentes importante.
É possível deduzir após a análise do cluster 1 que os técnicos de segurança no trabalho, consideram que o modelo sistémico e o epidemiológico são os dois modelos mais importantes a serem utilizados na análise de acidentes.
O modelo sequencial por seu turno, é o modelo de análise de acidentes menos importante. A atribuição dos técnicos de segurança trabalho a este modelo de análise de acidentes, é significativamente mais baixa que aos outros dois modelos embora no cluster 3 a diferença não seja tão evidente.
CONCLUSÃO
Ao longo deste estudo, foi possível observar que não existe uma visão clara e consistente na utilização dos modelos teóricos de análise de acidentes, por parte dos técnicos de segurança no trabalho.
Foi ainda possível concluir, que existe uma adesão pouco consistente dos técnicos de segurança no trabalho na utilização dos modelos de análise de acidentes. Existem, técnicos de segurança no trabalho que consideram que os vários modelos em questão são todos muito importantes, e em contraposição, existem outros técnicos de segurança no trabalho que consideram que estes modelos de análise não são importantes nas análises de acidentes.
Em suma, o modelo sistémico e epidemiológico parecem ser os modelos de análise de acidente, que colocam as questões mais importantes para responder de forma mais adequada às análises dos acidentes.
A principal implicação deste estudo, é ajudar a desenvolver uma metodologia de análise de acidentes comum a todos os técnicos de segurança no trabalho e dos vários profissionais que necessitem de realizar análises de acidentes com o intuito de as aproximar o mais possível da realidade.
"É possível deduzir (...) que os técnicos de segurança no trabalho, consideram que o modelo sistémico e o epidemiológico são os dois modelos mais importantes a serem utilizados na análise de acidentes.
O modelo sequencial por seu turno, é o modelo de análise de acidentes menos importante."
Acreditamos, que um dos pontos fundamentais que este estudo coloca em evidência é a necessidade de introduzir uma disciplina sobre investigação e análise de acidentes nos currículos dos cursos homologados pela Autoridade das Condições de Trabalho. Pois, irá permitir treinar os técnicos de segurança no trabalho sobre que caminhos percorrer nas suas investigações e análises de acidentes, e aproximar as suas conclusões o mais perto possível da realidade e com isto retirar informações e ensinamentos para o futuro.
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