ESTRATÉGIA OPERACIONAL, UMA FERRAMENTA DE GESTÃO AO SERVIÇO DA SEGURANÇA NO TRABALHO. A importância da atitude/comportamento na observação de equipas de trabalho: Relatos e reflexões

29 abril 2018
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Author :   Francisco José Guiomar
Indexação LATINDEX: Guiomar, F.J. 2017. Estratégia operacional, uma ferramenta de gestão ao serviço da segurança no trabalho. A importância da atitude/comportamento na observação de equipas de trabalho: Relatos e reflexões. Revista Segurança Comportamental, 11, 15-19 Francisco José Guiomar | Licenciado em Psicologia pelo ISPA. Técnico Superior de Segurança no Trabalho numa empresa do setor elétrico.

A mesma política, o mesmo sistema de gestão de segurança, os mesmos recursos, as mesmas atividades, as mesmas iniciativas, os mesmos perigos e riscos e as mesmas intervenções, geraram resultados significativamente diferentes neste caso do setor elétrico. Acredita-se que o conhecimento por parte das organizações das necessidades e características pessoais dos seus colaboradores é determinante para uma melhor compreensão dos seus comportamentos e assim se poder utilizar a comunicação e o envolvimento como um meio poderoso ao nível da própria mudança na apropriação do valor segurança.
O que aqui se pretendeu demonstrar, neste artigo, é que, apesar de todo o esforço que uma organização faça através do seu sistema de gestão da segurança, se o “comportamento” de toda a organização não estiver devidamente alinhado e não for visível e coerente com a política declarada, os resultados certamente não serão os esperados.

Nesta dissertação, de carater exploratório e de análise descritiva, o autor pretendeu dar a conhecer uma visão geral de um determinado fenómeno, ocorrido dentro de um determinado espaço temporal e numa população específica, assim como identificar hipotéticos problemas existentes numa estrutura organizativa.
O objetivo central deste trabalho, focou-se essencialmente numa análise reflexiva e empírica, relativamente aos resultados alcançados no âmbito da segurança no trabalho por uma determinada empresa do setor elétrico, principalmente, na correlação desses mesmos indicadores, entre todas as direções e os objetivos traçados por essa mesma organização.
Neste trabalho, tomou-se como ponto de partida o diagnóstico de 2009 feito à empresa em questão, como estando numa cultura de dependência, e também, todos os indicadores relativos à sinistralidade, associados a um período de 2010 a 2015, assim como, os objetivos estratégicos de segurança estabelecidos transversalmente a toda a organização.
O autor quis perceber como a mesma política; o mesmo Sistema de Gestão de Segurança Corporativo (SGSC); os mesmos recursos; as mesmas atividades; as mesmas iniciativas; os mesmos perigos e riscos e as mesmas intervenções, geraram resultados significativamente diferentes.
Em suma, pretendeu-se acima de tudo refletir, não nos objetivos em si, mas no percurso, para os conseguir, se fomos ou não eficazes, se estamos no caminho e na direção certa, se esta “viagem” se tornou uma experiência de mudar e sentir que estamos a fazer as “coisas” corretas no sentido de atingirmos os nossos objetivos.
Na base da problemática fica evidenciado que em estruturas organizacionais de grande complexidade, quer técnica, quer social, por vezes não é fácil chegar ao ponto de equilíbrio entre as necessidades e objetivos do negócio e o desejável em termos de aceitação do risco. Pressões sobre os prazos, urgências na execução, impacto mediático, lobbies, são por vezes fatores que levam a aligeirar ou mesmo facilitar alguns detalhes na aplicação dos procedimentos de segurança, sendo que o mais grave não é a própria situação, mas sim, a aceitação implícita da normalidade da mesma por toda a organização.
Outro problema, é, quando na tentativa de elevar a cultura de segurança dentro de uma organização, se cai num exagero com as próprias iniciativas e objetivos definidos, levando muitas das vezes à interpelação das equipas no terreno várias vezes no mesmo dia e por diferentes observadores, que tentam apenas cumprir calendários e indicadores estipulados, desvirtuando o principal objetivo para o qual tinham sido criadas e passando uma imagem de banalização da segurança e do papel da própria liderança.
Assim como é, por vezes a desarticulação dos meios existentes no âmbito SST (Saúde e Segurança no Trabalho), isto é, quando o modelo organizativo do serviço SST é complexo, desagregado numa estrutura matricial com equipas de composição muito variada e alocadas em diferentes estruturas organizativas, levando a que os canais de comunicação não sejam claros, haja hierarquizações diferentes e por vezes com interesses em áreas comuns e com isso se esbata a influência que os serviços SST poderiam ter na promoção da melhoria das condições de trabalho. Em suma, a inexistência de uma estrutura hierárquica vertical que englobe uma perspetiva apoiada em toda a organização funcional dos serviços SST, dificulta a gestão dos conflitos de interesse, assim como, a uniformização de procedimentos, bem como o tratamento de equidade que deverá haver para toda a organização.
Outro sintoma, é quando e não raramente, surgem comentários justificativos relacionados aos resultados da sinistralidade como um fator de sorte ou azar, não é que seja trágica esta abordagem, mas quando este nível de discurso é produzido em meios com alguma responsabilidade nesta matéria, passa a ser preocupante, pois é sintomático de que não se acredita e muito menos se sabe o que se está a fazer e para que serve, relembra-se pois que a sorte ou azar é apenas uma probabilidade estatística que se pode e deve controlar pelos meios disponíveis que as organizações têm ao dispor, e que este controlo, é uma responsabilidade da própria estrutura organizativa.
Acredita-se que o conhecimento por parte das organizações das necessidades e características pessoais dos seus colaboradores é determinante para uma melhor compreensão dos seus comportamentos e assim se poder utilizar a comunicação e o envolvimento como um meio poderoso ao nível da própria mudança na apropriação do valor segurança.
Ficou a convicção, que não é suficiente trabalhar apenas com estratégias organizacionais para se conseguir um ambiente de trabalho seguro, acredita-se sim, que o ideal é estabelecer a combinação dessas estratégias, com programas de capacitação e de relacionamento, alicerçado nos aspetos individuais, fazendo-os evoluir para objetivos coletivos, de equipa ou organizacionais.
Sabe-se que indiferentemente do nível em que estejam enquadrados os colaboradores, os seus variados costumes, atitudes, conhecimentos, e até mesmo as suas condições físicas e mentais, modificam-se à medida que neles se aprofundam aspetos tais como; a experiência; a formação; os interesses; a satisfação no trabalho; o reconhecimento; a ambição; a motivação; os sentimentos de justiça; as atitudes e as ações.
A ideia do autor foi criar um espaço de reflexão sobre os resultados relativos à sinistralidade e na correlação entre esses mesmos resultados e o esforço que foi despendido pela organização, foi também intenção, criar uma chamada de atenção à importância não dos objetivos em si, mas, fundamentalmente no modo de os alcançar, e entenda-se “modo”, não no sentido técnico, mas sim, na atitude, na postura e no acreditar daquilo que nos propomos realizar, em suma, quer-se realçar a importância do comportamento, mas, principalmente do nosso próprio comportamento como variável determinante na influência de mudança.
Por todos estes factos, pensa-se que esta análise empírica, focada essencialmente na componente humana e na própria gestão organizacional, será útil para a própria organização perceber e compreender as interações entre todos os seus agentes, quer tanto ao nível individual, quer mesmo de grupo ou organizacional, assim como, na obtenção de um conhecimento efetivo do que motiva e leva os seus colaboradores a seguir comportamentos seguros.
Em suma, e como defende Higgins, (1996) todos têm de sentir que são bem-sucedidos, a organização, as equipas SST e principalmente as equipas operacionais, pois sem essa sensação não existe “felicidade” nem motivação, por isso e na perspetiva de este autor, a eficácia é um dos pontos-chave que leva os indivíduos a modificarem os seus comportamentos no sentido do objetivo traçado.
Percebeu-se perfeitamente que é uma organização que está para além do cumprimento estrito da legislação, pois sente-se claramente que se está perante uma política de segurança que quer passar da fase do cumprimento dos requisitos legais para a fase da cultura de segurança.
Contudo, sabe-se também, que é precisamente nesta fronteira entre o objetivo da Política e a Cultura que para além de outras, existe uma dificuldade acrescida, “o comportamento”.
O que aqui se pretendeu demonstrar, suportado pelos dados apresentados é que, apesar de todo o esforço que uma organização faça através do seu sistema de gestão da segurança, se o “comportamento” de toda a organização não estiver devidamente alinhado e não for visível e coerente com a política declarada, os resultados para o qual esse SGS investiu, certamente não será o esperado.
Uma das conclusões é que, independentemente de todas as campanhas, iniciativas, encontros, Observações Preventivas de Segurança (OPS), workshops e formações de carater universal levados a cabo para toda a organização, os resultados alcançados foram completamente distintos, podendo-se mesmo afirmar que os objetivos esperados não foram conseguidos na maioria das Direções, em suma, face ao incremento e ao esforço de toda a organização, os indicadores da sinistralidade não refletiram o que seria expectável. 

Um dado interessante, é o fato dos únicos Pse (prestadores de serviços externos) a não terem registos de acidentes mortais e conseguirem os melhores índices de sinistralidade, foram aqueles que durante a empreitada foram alvo de menos auditorias, mas apresentando em comum um índice de frequência global inferior a 3 acidentes por milhão de horas trabalhadas, isto poderia levar-nos a pensar que, este reforço de auditorias é a consequência logica que os mais afetados negativamente pelos índices teriam de ser alvo, no entanto, e se a lógica foi apenas essa, poder-se-á afirmar com alguma certeza que algo não correu como o esperado, pois a evolução média dos índices de sinistralidade evoluíram negativamente ao longo do período da empreitada, refletido por exemplo pelo índice de gravidade (ig), em que se começa nos 255 em 2010 e com valores crescentes se termina nos 577 em 2014, falhando por completo um dos princípios orientadores, o compromisso de melhoria continua.

Poder-nos-á ser permitido especular que todas as iniciativas do SGSC aplicadas transversalmente a toda a organização, não terão chegado à sua origem da mesma maneira, ou pelo menos da maneira esperada, e porquê? Provavelmente pela complexidade e diversidade da estrutura organizativa? Falta de avaliação ao grau de aplicação e eficácia dos objetivos estratégicos? Linhas hierárquicas diferentes? Leituras e interpretações das iniciativas diferentes? Sentimentos em relação às questões da segurança diferentes? Prioridades diferentes? Até e por que não, pela falta de conhecimento da própria estrutura hierárquica de como abordar e interpretar os “sinais” obtidos pelos dados da sinistralidade.
Independentemente de qual a resposta, ou da interpretação que se queira fazer dos dados apresentados, existem algumas leituras às quais não se pode ficar indiferente, e uma delas é que não é aceitável acabar 2014 com o mesmo número de acidentes mortais que se teve em 2011, e começar logo 2015 com 1 acidente mortal.
Existiu uma curiosidade óbvia da parte do autor, em termos analíticos, o de tentar perceber porque é que dentro da mesma organização, onde existem princípios orientadores da prática de segurança bem definidos, onde a prática em matéria de segurança é um fator de gestão empresarial, sujeita às mesmas regras e iniciativas gerais por parte do SGSC, levaram em termos estatísticos umas Direções a obter sistematicamente resultados completamente inversos aos observados nas outras Direções.
O autor é tentado em afirmar, e acredita que o problema não está nos “princípios orientadores”, mas sim no modelo organizativo (na forma como somos e como expressamos o compromisso visível com a Segurança, na nossa forma de atuar), a que estes princípios estão “subjugados” para incrementar a mudança cultural pretendida, foram definidos 3 vetores, compromisso visível; envolvimento; comunicação; e tem em crer, que a mensagem de tais princípios, não chegou nem corretamente, nem com a eficácia esperada à estrutura da prevenção e segurança, e que por sua vez, “esses princípios” foram subvertidos em dados numéricos em prol de objetivos quantitativos, pois custa a crer, que 1.047 auditorias efetivas no terreno ao Pse 7, tenham tido menos eficácia, que as 157 efetuadas ao Pse 0 durante o ano de 2014 (ver 1.º gráfico).
Também fica evidente que a gestão da segurança baseada nos comportamentos apenas garante resultados no desempenho de segurança em organizações que tenham índice de frequência inferior a 3 acidentes por milhão de horas trabalhadas, em resultado de uma organização de segurança eficiente, suportada por uma Política de Segurança compreendida e explicitada por todos; empresa, estruturas organizativas e parceiros de negócio.
No entanto o autor, não quis terminar esta reflexão, sem antes referir Anthony Robbins, onde se pode perceber que as crenças são os meios que nos proporcionam o acesso aos nossos objetivos, assim como nos garantem que os vamos atingir, e acredita que se quisermos mudar comportamentos, teremos de começar por rever as nossas próprias crenças, e se quisermos a “excelência” precisamos acima de tudo, aprender a modelar as crenças “daqueles” que a atingiram. Não chega traçar objetivos nem criar projetos, temos mesmo que acreditar neles, “O homem é aquilo em que acredita” – Anton Tchekov, in (Robbins, 2003), e como afirma Tory Higgins, somos motivados por aquilo em que acreditamos, daí a importância da partilha das nossas crenças com as nossas equipas, no sentido de que elas se vão “modulando” para um valor comum, só assim se pode assegurar a construção de um percurso ou “viagem” de mudança em direção ao objetivo pretendido.
Não foi intenção do autor ser poético nem estabelecer regras filosóficas sobre o assunto em questão, no entanto, e para finalizar gostaria de relembrar que qualquer estrutura com alguma complexidade, para “funcionar”, tem de ser congruente, isto é, todas as suas partes tem de funcionar em conjunto, e movimentar-se no mesmo sentido e sincronizadamente, em direção a um objetivo comum, mas atenção; “Um músico deve fazer música, um artista deve pintar, um poeta deve escrever, se no fim quiserem estar em paz consigo próprios.” – Abraham Maslow.

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Nota: Retirado e adaptado da dissertação de mestrado de 15 de fevereiro de 2016

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A revista Segurança Comportamental é uma revista técnico-científica, com carácter independente, sendo a única revista em Portugal especializada em comportamentos de segurança.

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