O comportamento humano é um dos cinco pilares da segurança rodoviária. Significa isto que, de entre as causas que contribuem para os acidentes, há na esmagadora maioria dos casos um contributo de acções e de reacções que, conjugadas, conduziram a que, naquele momento e lugar, ocorresse um acontecimento fortuito, inesperado, normalmente com consequências nefastas. Na verdade, o comportamento humano é origem e causa de uma grande parte dos acidentes. O desrespeito pelas normas vigentes, ou mesmo a incapacidade técnica para ultrapassar um imprevisto, são na maioria dos casos, causa do acidente rodoviário. Quando o trânsito automóvel o exigiu, princípio do século XX, foram adoptadas algumas medidas, tanto inspectivas como preventivas, no sentido de trabalhar o comportamento dos indivíduos com o objectivo de tornar menos frequente a ocorrência de acidentes.
«O comportamento humano é um dos cinco pilares da segurança rodoviária.»
Assim, foram vários os instrumentos utilizados para este fim pelo Estado encontrando-se hoje estabilizados e reconduzindo-se aos seguintes:
- Lei;
- Sistema de ensino (formação);
- Campanhas de segurança rodoviária;
- Fiscalização;
- Aplicação de sanções (a aplicação da sanção deve ser feita por entidade diferente da que a detectou tendo em vista a análise rigorosa e independente dos factos e a sua subsunção ao direito, quer se trate de uma sanção de natureza administrativa quer do foro criminal).
Para além do comportamento, existem mais dois pilares na segurança rodoviária, sendo estes, o automóvel e a via. Também estes dois últimos pilares deverão evoluir tendo em conta as necessidades e os condicionalismos do ser humano, de forma que sejam eliminar ou reduzir as acções e reacções de risco. Vejam-se, a título de exemplo os sinais avisadores incorporados nos veículos ou a concepção das vias tendo em conta a percepção do ambiente rodoviário pelo utilizador.
Com efeito, nos países mais desenvolvidos, em que o sistema rodoviário está planeado e é gerido com a incorporação da segurança rodoviária, as redes rodoviárias vêm sofrendo aperfeiçoamentos tendentes a fazer desaparecer os locais que podem apresentar alguma perigosidade para os utentes. Nestes países, os parques automóveis pelas suas idades médias, qualidade e estado de conservação são tão seguros quanto o desenvolvimento técnico-científico e o nível de vida da generalidade da população o permitem, e o socorro à vítima é eficiente e eficaz.
«Em março de 2010, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma Resolução relativa à Década de Acção para a Segurança Rodoviária 2011-2020, em que se exortam os Estados a actuar sobre o comportamento dos utentes das vias.»
Por isso, sem prejuízo da necessidade de se investir na investigação e desenvolvimento em todas as áreas relacionadas com a segurança rodoviária, há que reconhecer que a actuação sobre o comportamento humano apresenta-se hoje como uma grande oportunidade de melhorar, reduzindo mais o número de acidentes e diminuindo a gravidade das consequências dos que ocorreram, designadamente, mortes, ferimentos e consequentes deficiências, assim como danos materiais.
Em março de 2010, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma Resolução relativa à Década de Acção para a Segurança Rodoviária 2011-2020, em que se exortam os Estados a actuar sobre o comportamento dos utentes das vias.
A regulação, a conformação do comportamento dos utentes das vias é, porventura, tão antiga quanto a existência dessas mesmas vias. Sem embargo, primeiro com legislação avulsa, depois com regulamentos e, mais tarde, com Códigos, assim como com convenções internacionais (é de assinalar a Convenção de Paris de 1909, que esteve na génese da generalidade dos códigos da estrada), o trânsito encontra-se hoje legalmente disciplinado e em evolução constante há mais de cem anos.
A segurança rodoviária é uma preocupação presente de alfa a ómega, já expressamente afirmada no Regulamento Português sobre Circulação de Automóveis de 1901 e hoje expressamente prevista no objectivo 24 da Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária, aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 54/2009, de 26 de Junho, pelo qual se pretende melhorar a prevenção e fiscalização da aplicação do Código da Estrada, encorajando os utentes das vias públicas a adoptar comportamentos seguros e criando melhores condições para se garantir a aplicação, em cada caso, das sanções mais adequadas aos infractores, naturalmente em face do perigo, ainda que potencial, que o comportamento verificado in casu representa para a segurança rodoviária.
Mas não só por via legislativa, nem da aplicação de regras jurídicas, sua fiscalização e aplicação de sanções se pretende actuar, se pode moldar a forma como os indivíduos agem e reagem perante as circunstâncias, seja no caso de comportamentos reflexos, seja dos motivados.
Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária Portuguesa, actua sobre o comportamento, através:
- Do sistema educativo, desenvolvendo competências e capacidades nas crianças e jovens para uma integração mais segura no ambiente rodoviário;
- Do sistema formativo, pela introdução de alterações do modelo do ensino na condução.
Com efeito, como resulta da leitura da Estratégia Nacional de Segurança Rodoviária Portuguesa, a actuação sobre o comportamento faz-se também através do sistema educativo, desenvolvendo competências e capacidades nas crianças e jovens para uma integração mais segura no ambiente rodoviário, e do sistema formativo, pela introdução de alterações do modelo do ensino da condução, que levam à interiorização de atitudes e comportamentos privilegiando a segurança rodoviária, pela consagração de novas práticas e de novos conceitos do ensino da condução, assim como pela possibilidade de, ao longo da vida, se criarem condições para a adopção de novos comportamentos relativos à condução e ao ambiente rodoviário, que evoluem a um ritmo mais acelerado do que a sociedade.
Também a melhoria do ambiente rodoviário, com a dotação das vias com características e equipamentos (ITS - Intelligent Transport Systems) que conformem os comportamentos adoptados pelos seus utentes, ou que permitam atenuar as eventuais consequências de comportamentos menos adequados, a comunicação, e, em especial, as campanhas de segurança rodoviária, são outras áreas que muito podem contribuir para comportamentos mais adequados, que exponham menos o indivíduo ao risco.
Bibliografia
Donário, Arlindo (2007). Análise Económica da Regulação Social, Causas, Consequências e Políticas dos Acidentes de Viação. Lisboa: UAL.
Gonçalves, Manuel Lopes Maia (2001). Código Penal Português. Coimbra: Almedina.
Vieira, Francisco Marques (2007). Direito Rodoviário Penal. Porto: Universidade Católica.